sábado, 15 de setembro de 2012

Ir para a rua





Custou-me sair de casa. Tenho (muito) trabalho para fazer e coisas para começar a encaixotar. Aliás, era isso que estávamos a fazer quando o meu homem disse que queria ir à manifestação. Ainda não tínhamos falado sobre isso, e eu não tenho grande feitio para ir para a rua. Feitio e alguma recusa. Porque eu votei neste governo, eu fiquei feliz quando vi todos os ministros tomarem posse, tive esperança. Tenho dúvidas se podemos culpar inteiramente um grupo de pessoas que pegou num país já em frangalhos. Mas por outro lado, vejo muita coisa que me revolta. Vejo os meus pais a contar tostões, depois de terem passado a vida a trabalhar. Vejo o meu marido sem perspectivas de estabilidade no trabalho, vejo-me a mim, com 35 anos, uma licenciatura, uma filha e incapaz de me sustentar. E o que mais me assusta neste momento, é não ter perspectivas de futuro. E custa-me muito aceitar que ainda não é este governo que nos vai tirar desta vergonha de situação.
E a minha indecisão relativamente a ir aos Aliados teve a ver com o facto de ter que trabalhar. Como é que eu luto melhor pelo meu futuro? É manifestando-me por um futuro melhor? Ou é trabalhando por um futuro melhor? Não sei. Mas sentimo-nos bem, porque fomos. Porque batemos palmas, porque caminhamos juntos. Porque estivemos. 
As palavras de ordem eram fortes "Memento Mori", outras irónicas "Oh Relvas, dá-me o teu avental" e "O governo é um bando de Noobs". A certa altura reparámos que havia mais gente parada do que a caminhar. E não fomos os únicos. Alguém começou e os outros repetiram "Sai do passeio e vem aqui para o meio". Na rua de Sá da Bandeira, à porta de uma loja estavam dois empregados com um cartaz que dizia "Putas ao governo porque os filhos já lá estão". 
Há muita gente zangada, há muita gente a passar mal. Mas também há muitos parasitas. Havia um arrumador no parque de estacionamento ao ar livre, onde deixámos o carro, e que é suposto ser gratuito ao fim-de-semana. O meu marido deu-lhe uma moeda, por medo que o homem lhe riscasse o carro. E os beneficiários de RSI que vejo frequentemente a tomar ricos pequenos-almoços no café e que não fazem nada pela vida. Mas não são esses que me interessam.
Todos queremos um mundo melhor. Uns mais do que outros, é certo. Todos queremos ser felizes. E hoje, como país, não somos.
Acima de tudo há uma crise de valores. De prioridades. Não é só dinheiro que falta nos bolsos dos portugueses. É educação, é generosidade. Se cada um de nós olhasse mais para o lado, se aos governantes interessasse mais o bem do país do que projecção, bem-estar e riqueza, seria tudo diferente. Seria tudo melhor. Para lutar por isto, para pensar nisto, foi muito bom interromper o trabalho, levantar da cadeira e ir para a rua fazer pela vida.

3 comentários :

  1. Adorei este texto. Revi-me nele. E é de pessoas que saiam para a rua e lutar por direitos básicos e dignidade que reza a história! Um beijo bem grande

    P.S- Respondi-te no post da mochila, mas fica aqui também. É da Imaginarium e é em tecido, foi a única que gostei... Abomino Kiitys e assim...

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  2. Adoro o texto!
    Não sou nada dada a manifestações, mas confesso que nesta queria participar. Mas não pude. Estava sozinha com o meu bebé e não arrisquei irpara o Porto ou para Braga sozinha com ele.
    O meu marido, infelizmente, teve que trabalhar. Está desempregado e foi fazer um trabalho porque tem memso que ser.
    Mas fiquei em casa a ver a manifestação, e confesso que me emocionei. Não estive presente, mas estive lá de alma e coração.
    Um beijo*

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  3. Princesa, obrigada! Já andava a pensar encomendar uma online, mas acho que hoje vou espreitar a Imaginarium. Sendo uma das lojas que mais gosto, nem sei como não fui lá ver!

    Raquel, fiquei com pena de não ter levado a B. Porque foi bastante pacífico, embora a dada altura alguém tenha lançado um petardo perto de nós. Mas ainda bem que fui, estou tranquila.

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